No caminho para o trabalho.
— Olha, eu nem estou ligando mais para o peso do trabalho. O que está mais me chateando são as pequenas coisas, aquelas exigências totalmente desnecessárias.
— Mas ninguém disse que você tem que concordar com as exigências que ninguém chamou de exigências.
— Ah não? Então por que você está usando ter cinza dentro da tonalidade sugerida pelo chefe?
— Ah, mas não custa atender um ou outro capricho.
— Ah sim. E por que você está usando gravata de lista diagonal sendo que eu sei que você tem diversas outras gravatas bonitas que não são de listras? Já me emprestou algumas, lembra?
— É só uma chatice de chefe, o que tem de mais?
— Desde quando você usa barra para segurar colarinho? Vai me dizer que gosta de perder meia hora toda manhã só para ajeitar esse treco?
— É, aí confesso que acho um exagero.
— Nós somos uma equipe de venda de software, não de venda de ternos ou de acessórios. Que diferença faz um tipo ou outro de gravata se estivermos bem-vestidos?
— Já que você está na sua toada de reclamação, fiquei com raiva da sugestão de qual caneta temos que usar no cliente. Basta uma bonita e que escreva, não precisa ser Waterman nem Montblanc nem outra do nível. Sugerir as marcas foi demais até mesmo para mim, que sou compreensivo.
— Daqui a pouco vai querer sugerir o tipo de tecido da camisa.
— Nem me fale, vira a boca para lá.
— Pois é, se ainda fôssemos um time excepcional, mas não somos porque metade das reuniões é o chefe dizendo o quanto estamos longe da etiqueta de roupa que ele espera de nós. Não seria melhor a gente usar esse tempo para fazer um treinamento, fazer um benchmarking, ver o que os concorrentes estão fazendo? Não seria mais útil?
— Sim, sem dúvida seria mais útil. Mas não, a gente tem que ficar prestando em firula, sabendo que ninguém da equipe sairia vestido desleixadamente para uma visita ao cliente. Ali só tem profissional, pelamôr.
— Se pelo menos a estratégica cosmética estivesse funcionando, mas pelo que vejo no meu bolso, está tudo igual.
— É isso o que mais dói, mania de chefe que é só isso mesmo, mania, caprichos etéreos.
— Deixa mais uns meses e ele vai pedir abotoadura.
— Arre! Para de dar ideia que ele acaba ouvindo, seu maluco.
— Aconteceu como predito, porque já tinha acontecido antes. O chefe passou em revista a equipe para ver se estava nos conformes de vestimenta dele. O pessoal obedecia para não dar um azar e ser dispensado. Mesmo quando estava tudo bem, o chefe dava um jeito de reclamar de alguma coisa que não tinha absolutamente com o desempenho da equipe, com a satisfação no trabalho, com os desafios de vendas, com o moral do pessoal.
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Era um fardo. Pesado, inútil, ligado aos detalhes e não no cotidiano, ligado aos tons de lavanda dos sais de banho, uma inutilidade só. Uma inutilidade malévola, porque desgastava a equipe e não a ajudava a ser ver melhor, a trabalhar com mais intencionalidade.
Só chatice mesmo, firula de quem não tem mais o que fazer.
Fardo.
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EDITORIA | .felipeurbano
Créditos da foto: sandas04
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