O clima na família era de correria eufórica. Madalena ia se casar!
A casa estava em polvorosa. Todo mundo já sabia que o pedido viria, mas veio num dia tão propício. Júlio tinha ficado com ela o tempo todo em que Madalena se recuperava de um tombo bobo em casa mesmo. No dia em que teve alta, Júlio chegou com as alianças e, na frente dos pais, pediu sua mão em casamento.
Alianças lindas que agora decoravam a mão direita dos dois. Nada de enrolação, que se casem logo, para gosto de Madalena e de todos.
Só uma coisa impedia que se julgassem Madalena e Júlio um casal perfeito, a saber, o perfeccionismo irritante de ambos. Tudo tinha que estar muito bem planejado até o último milímetro, até o último segundo. Nada poderia estar fora do lugar. Afinal, era um amor de verdade que se enlaçava.
De todas as coisas perfeitinhas que eles planejaram, a decoração foi votada por todos como a mais perfeita. Um arranjo rico de tons pastéis a cada banco da igreja, para o lado de dentro do corredor onde a noiva estilhaçaria os olhos dos convidados com sua beleza. Ligando um arranjo a outro havia uma fita rendada com tons combinando com os arranjos. No meio de cada arranjo uma vela, cada uma acesa um minuto antes de cerimônia começar. Um brinco!
Ela, irmã caçula da Madalena, com sete anos mal completados, seria a mocinha que entraria no meio da cerimônia para levar as alianças até os noivos. Ela exultava porque amava a irmã mais velha, que a tratava a pão de ló. Entrou no espírito da casa e se preparou mentalmente, ensaiando passo por passo. Nada de errado poderia acontecer porque
Madalena ia se casar!
Aconteceu assim. No meio do corredor, bem no meio, uma ruga no tapete a fez tropeçar. A almofada com as alianças caiu para um lado, as alianças rodaram para debaixo da multidão indistinta dos pés dos convidados.
Quando caiu, ela tentou se apoiar em alguma coisa e só encontrou a fita que ligava os arranjos. Quando puxou a fita, diversos arranjos também foram ao chão, cada um com sua respectiva vela acesa. O tapete vermelho ensaiou um início de fogo onde as velas caíram. Os convidados com presença de espírito entraram no corredor para apagar os focos de fogo enquanto ainda estavam tímidos. A confusão estava instalada, a cerimônia arruinada.
Desmaiou de vergonha. Só acordou em casa, com pai e mãe observando preocupados.
— Cadê a Madalena? Ela me odeia, né?
Agora ela não tem mais sete anos. Tem quarenta, tempo suficiente para se fazer uma diretora financeira. Na sua sala, com as persianas baixadas, ela olha fixamente para um papel na mão.
No papel está a notícia de que um carregamento do exterior, o maior dos últimos dez anos, está parado na alfândega por problemas de pagamento. Tudo nessa operação estava medido milimetricamente, a empresa dependia dessa operação para voltar ao azul e sobreviver.
Só que ela calculou mal o câmbio. Fez uma aposta equivocada no dólar. Agora a empresa teria que desembolsar o dobro do dinheiro planejado para recuperar a carga. Todo mundo perderia o bônus do ano por causa desse erro.
Lembrou-se dos seus sete anos e da mana Madalena. Num átimo toda a cena do tropeço veio à sua mente, aquele erro que custou a perfeição do casamento da irmã.
Olhou para o papel pela milésima vez. Desceu para a cafeteria e pediu um espresso duplo, sua coragem líquida.
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Crédito da foto: @nicokokartinspiration
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